Não existem curandeiros sem curandeiras. Um curandeiro recebe o poder de uma mulher, e sempre foi assim. O curandeiro substitui o cachorro. Não passa de instrumento de uma mulher. Hoje em dia não parece mais ser assim, mas é verdade.
— Agnes Alce-Que-Assovia
Uma lua amarela surgiu por trás das colinas, a distância. O céu era belo, imenso, e ouviam-se os coiotes entoar sua canção lamentosa.
Eu estava sentada diante de uma fogueira ao ar livre, na companhia de uma velha índia. Seu rosto, tão enrugado quanto um fruto amadurecido, tinha maçãs salientes, e suas longas trancas caíam bem abaixo dos ombros. No pescoço, um colar de contas, destinado à cura, por cima da blusa verde xadrez.
— Sua vida é um caminho — afirmou e, no início, era difícil entender o sotaque carregado. — Sabendo, ou não, você tem andando em busca de uma visão. É bom ter uma visão, um sonho.
Existia naquela criatura algo que se impunha. Sua personalidade parecia modificar-se de um momento para outro. Embora sentisse dificuldade em exprimir em inglês os pensamentos mais simples, era tão erudita quanto qualquer outra pessoa que eu conhecia, além de possuir grande dignidade.
— A mulher é o máximo — afirmou. — A mãe terra pertence à mulher, não ao homem. Ela carrega o vazio.
Foram as palavras que me dirigiu antes de me tornar sua aprendiz. É uma curandeira ou heyoka. Estava destinada a segui-la durante sete anos. Este livro é um registro de minha jornada através de seus domínios, estranhos e belos. É uma comemoração do poder da mulher, tal como ela me fez enxergar esse poder.
Estou caminhando através de uma paragem distante. A pradaria está recoberta de vegetação rasteira, esparsa, e de cedros que se concentram em alguns pontos. Penso num vale solitário, numa cratera da lua. Em meio àquele silêncio, estranho e vasto, deparo com um armário todo esculpido. Seu artesanato é notável. Consigo enxergar através de suas portas translúcidas. A esquerda, por detrás do vidro, um rosto de mulher me encara. E o de uma antiga índia americana. À direita, vejo um corvo de um negro azulado. A cena recorda-me um quadro de Magritte.
A cabeça da mulher, de repente, começa a cair para trás e para a frente, em movimentos ritmados, como um metrânomo.
— Quantas vezes preciso dizer — ela me repreende, sem interromper o movimento da cabeça — que o cesto de casamento não está à venda? Você precisa conquistá-lo.
Enquanto estou sendo admoestada, minha atenção desvia-se para o olho brilhante do corvo. Seu corpo gira e ela encara a cabeça da mulher, movimentando-se na mesma batida de um metrânomo.
Fico assustada. O corvo começa a imitar a fala da velha. As duas vozes não se confundem e são tão belicosas que estremeço.
Vi apenas um cesto de casamento em toda minha vida. Sei, porém, que o cesto ainda existe. Onde, ignoro,
— Hyemeyohsts Tempestade
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