Cogumelos no Almoço
(1960)
TIMOTHY LEARY
Huxley e Osmond visitaram o Dr. Timothy Leary em Harvard, onde o Projeto de
Pesquisa sobre Psicodélicos estava em andamento. Aqui está narrativa de Leary sobre suas impressões a respeito de Huxley na ocasião de seus primeiros encontros em Cambridge.
[...] George [Littwin] começou a falar sobre a literatura a respeito de estados visionários e perguntou-me se eu tinha lido os livros de Aldous Huxley sobre a mescalina, As portas da percepção e Céu e inferno, e quando eu disse que não ele desceu correndo o corredor até seu escritório e trouxe-os. Retângulos pequenos e finos. Enfiei-os nos bolsos de meu paletó.
O assunto final era importante. Onde arranjaríamos os cogumelos? Alguém tinha me dito que o Serviço de Saúde Pública tinha conseguido sintetizar os cogumelos, e eu disse que escreveria a Washington e tentaria verificar essa pista. Gerhart [Braun], 1á no México, tinha me dito que ia continuar a procurar Juana, a bruxa, e se a encontrasse ele conseguiria um grande suprimento e mandaria uma parte para mim. E Frank Barron, em Berkeley, tinha me dito que o pessoal da Universidade do México tinha cultivado cogumelos e talvez pudéssemos arranjar alguns com eles.
Naquela no!te li Huxley. E depois tornei a ler os dois livros. E li de novo. Estava tudo lá. Toda a minha visão. E mais ainda. Huxley tinha tomado mescalina num jardim e dado um pontapé na mente e despertado para a eternidade.
Mais ou menos uma semana depois, alguém numa festa me disse que Aldous Huxley ia passar o outono na cidade, e aquilo parecia um bom presságio, de modo que sentei-me e
escrevi-lhe uma carta.
Dois dias depois, durante uma de nossas reuniões de planejamento, o Sr. Huxley telefonou para dizer que estava interessado, e marcamos um almoço.
Aldous Huxley estava hospedado num novo apartamento do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) dando para o Rio Charles. Ele atendeu à campainha – alto, pálido, frágil – e fomos de carro para o Clube da Faculdade de Harvard. Ele leu lentamente o cardápio através de sua lente de aumento. Perguntei-lhe se queria sopa e ele perguntou que tipo de sopa era e eu consultei o cardápio e era sopa de cogumelos, de modo que rimos e comemos cogumelos no almoço.
Aldous Huxley: Buda curvado, imponente, grisalho. Um homem bom e sábio. Uma cabeça como uma enciclopédia multilíngüe. Voz elegante e alegre, exceto quando o tom se elevava em indignação passageira e divertida por causa da superpopulação ou da pomposidade dos psiquiatras.
Conversamos sobre como estudar e utilizar as drogas que expandem a consciência, e
concordamos agradavelmente no que fazer e no que não fazer. Evitar a abordagem comportamentalista da consciência dos outros. Evitar rotular ou despersonalizar a pessoa sob a droga. Não deveríamos impor nosso jargão ou nossos próprios jogos experimentais a outras pessoas. Não pretenciamos descobrir novas leis, isto é, descobrir as implicações redundantes de nossas próprias hipóteses. Não nos limitaríamos ao ponto de vista patológico. Não interpretaríamos o êxtase como mania, ou a tranqüila serenidade como catatonia; não iríamos diagnosticar Buda como um esquizóide desligado; nem Cristo como um masoquista exibicionista; nem a experiência mística como um sintoma; nem o estado visionário como um modelo de psicose. Aldous Huxley rindo. com humor cheio de compaixão, da loucura humana.
E com que erudição! Avançando e recuando na História, citando os místicos, Wordsworth, Plotino. O Areopagita. William James. Indo desde o passado esotérico, de volta ao presente bioquímico: Humphry Osmond curando alcoólatras em Saskatchewan com LSD; Keith Ditman e seus planos para limpar os becos marginais de Los Angeles com LSD; Roger Heim levando seu saco de cogumelos mexicanos para os químicos parisienses que não conseguiram isolar o ingrediente ativo, e depois procurando Albert Hofmann, o grande suíço, que o conseguiu e chamou-o psilocibina. Tinham mandado as pílulas para a curandera em Oaxaca e ela experimentou-a e teve visões adivinhatórias e ficou feliz porque poderia praticar seu trabalho o ano inteiro e não parecia um bom presságio, de modo que sentei-me e escrevi-lhe uma carta.
Aldous Huxley estava agudamente consciente das complicações políticas e da esperada oposição dos Murugans, o nome que ele deu ao pessoal detentor de poder em seu romance A ilha.
– Drogas... Murugan estava me falando sobre os fungos que são usados aqui como fonte de drogas.
– O que é um nome? [...] Resposta: praticamente tudo.
Murugan chama de droga e sente a respeito dela toda a desaprovação que, por reflexo condicionado, o palavrão evoca. Nós, pelo contrário, damos a ela nomes bonitos – a medicina-moksha, o revelador da realidade, a pílula da verdade-e-beleza. E sabemos, por experiência própria, que os nomes bonitos são merecidos. Enquanto que este nosso jovem amigo não tem qualquer conhecimento em primeira mão da substância e não pode ser convencido nem mesmo a experimentar. Para ele é droga, e droga é algo de que, por definição, nenhuma pessoa decente se aproxima.
Aldous Huxley aconselhou, explicou, brincou e contou casos, e nós ouvimos, e nosso projeto de pesquisa foi planejado de acordo com isso. Huxley ofereceu-se para participar de nossas reuniões de planejamento e estava pronto para tomar cogumelos conosco quando a pesquisa estivesse em andamento.
Dessas reuniões nasceu o esboço de um estudo-piloto naturalístico, no qual as pessoas sob a experiência seriam tratadas como astronautas – cuidadosamente preparadas, sabendo de todos os fatos disponíveis, e depois deixadas para manejarem sua própria espaçonave, fazerem suas próprias observações, e apresentarem-se de volta ao controle no solo. Não seriam pacientes passivos, mas heróis-exploradores.
Durante as semanas de outubro e novembro de 1960, houve muitas reuniões para planejar a pesquisa. Aldous Huxley chegava, ouvia e depois fechava os olhos e desligava-se dali para entrar em seu transe de meditação controlado, o que era enervante para algumas das pessoas de Harvard que confundem atenção com conversa, e depois ele abria os olhos e fazia um comentário que tinha a pureza de um diamante...